Platão e a República



Muitos vivem com se estivessem em uma caverna, sem ver nada além de sombras e acreditam que elas são a realidade, porém, se forem expostos à luz do sol, serão ofuscados em um primeiro momento, até que possam se adaptar e passem a ver tudo com clareza.  

Através da “Alegoria da Caverna”,  Platão nos mostra dois mundos: o sensível, representado por quem está na caverna e se deixa enganar pelos sentidos, e o inteligível (mundo das ideias), capaz de conduzir o indivíduo para fora da caverna, em direção ao caminho da luz, do Bem, e portanto, do conhecimento verdadeiro, das essências imutáveis. 


 
Alegoria da Caverna 
https://www.youtube.com/watch?v=2S0_-EQO8wc

 

O “Livro VII”, d' A República, nos mostra que a moral e a política para Platão são indissociáveis e que é necessário ao homem conhecer o Bem para que ele se torne um homem justo e virtuoso. De acordo com Platão, se o homem não puder conhecer o Bem por si mesmo, deve ser orientado pelo filósofo, que chegou a este conhecimento. Desta forma, Platão justifica que os filósofos, conhecedores do Bem, devem, portanto, ser os líderes da cidade em prol do bem de todos. 


Na cidade-modelo, Platão descreve a educação minuciosa dos futuros governantes e destaca que tanto na formação dos filósofos quanto na criação de uma cidade é necessário que haja a virtude, e esta se divide em quatro: a sabedoria, a coragem, a temperança e a justiça.


É interessante destacar que, de acordo com Platão, na cidade-modelo há uma hierarquia e uma divisão de trabalho, na qual há os que contribuem para o bem material, ou seja, os camponeses, artesãos, comerciantes; e os que gerenciam a cidade e a protegem – os guardiães e os dirigentes. 

Todavia, segundo Platão, os que contribuem para o bem material da cidade devem ter dinheiro e bens particulares, enquanto os governantes, selecionados entre os guardiães não devem usufruir de nenhum bem próprio, nenhum dinheiro e tampouco devem ter direito à uma vida privada. 

Os governantes receberão seu sustento da outra classe para guardar e proteger a cidade e para isso devem ter treinamento militar, receber aulas de música e ginástica, receber aulas de matemática, porque esta conduz ao conhecimento das realidades inteligíveis, ou seja, das ideias. O estadista ou rei-filósofo, não governará em benefício próprio, movido pelas paixões, mas, na perspectiva que a prática política é um sacrifício, governará em busca do Bem em si. Como podemos ver, Platão não defende uma usurpação tirânica do poder, mas sim, todo um percurso educacional, assim, o estadista de Platão o é porque não tem paixão pelo exercício do governo.

É a matemática, é não outra, de acordo com Platão, que revela a todos a ordem e a medida, e portanto, revela igualmente um mundo harmonioso. A matemática, o estudo da astronomia e da música se somam na formação do filósofo, para que este, mesmo diante do mundo sensível e enganoso, possa enxergar a ordem e a medida presentes no mundo inteligível. 

Frente ao pensamento de que o estadista deve ser sábio e virtuoso, não é a matemática, mas sim, a dialética, segundo Platão, que é imprescindível à formação do governante, pois trata do que é essencial e conduz o governante à justiça e ao Bem.


Platão trata também de forma embrionária do feminismo e eugenismo ao propor que os guardiães, os homens e as mulheres, recebam a mesma educação,  que as mulheres não tenham mais que cumprir as atividades domésticas, e que os filhos sejam retirados das mulheres no nascimento para que outros homens e mulheres se encarreguem dos cuidados. Com isso, o filósofo visa o fim da família privada e a criação de uma grande família, onde até mesmo os casamentos devem acontecer em prol do bem da comunidade, visando a melhor descendência.

Sublinhamos que é na infância, de acordo com o "Livro VII", que se inicia a formação política da criança e o processo de ensino-aprendizagem do filosofar se dá através da brincadeira, dos jogos lúdicos, pois o processo espiritual não pode ser forçado. Porém, é também na infância, segundo Platão, que a criança deve aprender a combater, a gostar de sangue, para que na maturidade possa governar dialeticamente.

Conforme observamos, nossa organização política e vida em sociedade foi muito influenciada pelos pensamentos de Platão, no entanto,  resta-nos uma dúvida, até que ponto, nos dias atuais, diante de tantos estímulos audiovisuais e meios eletrônicos, nos libertamos de fato da caverna?



Referências:

PIETTRE, Bernard. Platão, A República: Livro VII: Comentários. Trad. Elza Moreira Marcelina, Brasília: Universidade de Brasília; São Paulo: Ática, 1989.

PLATÃO. A República. Lisboa: Calouste Gulbenkian, 1990. 












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